segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

História de uma brasileira búlgara

O texto de hoje é sobre a imagem que os alemaes têm da gente. Assim como nós fazemos uma imagem deles, a partir de experiencias ou informacoes que nos chegam, eles também fazem isso. É um processo que todo ser humano realiza quando se depara com algo "desconhecido": primeiro ele procura no seu cérebro algum tipo de ligacao com o que ele já ouviu falar a respeito e a partir das experiências que ele já teve. O nosso cérebro é extremamente otimizado. Ele formula uma tese, idéia ou um principio a partir de uma experiência e usa esse "molde" para as próximas situacoes que vêm pela frente. Isso ajuda a gente a nao ter que perder tempo, aprendendo tudo de novo e de novo. O nosso cérebro gosta de economizar tempo e trabalho.
 Se nao fosse assim, o nosso cerébro teria que passar por um enorme processo de identificao cada vez que a gente conhecesse uma pessoa nova. Teria que analisar os pontos e formar um conceito a partir das experiencias que voce passa com cada individuo para, a partir daí, voce ter uma nova imagem, uma nova tese, uma nova ideía. Extremamente trabalhoso. 


Mas esse processo que pro nosso cerébro é rotineiro, traz para nós algumas desvantagens. 


Por isso a nossa tendência é botar as pessoas em gavetas e etiqueta-las todas. Um exemplo: pra gente, alemao gosta de chucrute, anda com calcas de suspensório, canta a tirolesa tocando acordeao e bebe 5 litros de cerveja por dia. E sao brancos.
Bom, entao vou dizer como eles nos vêem a partir do meu ponto de vista. Sempre quando vou a algum lugar desconhecido e tenho que me apresentar ou falar algo, já aguardo a pergunta típica. Alguns tentam ser mais polidos e perguntam com todo o cuidado do mundo, como se ser um estrangeiro fosse uma coisa horrível:
"olha, me desculpe, nao quero ofender, a meu ver voce fala alemao muito bem, acho incrível como você domina o nosso idioma. Porém eu tive a ligeira sensacao de escutar um sotaque que demonstra que você nao vem dessa regiao. Você me faria esse obséquio em dizer em que lugar voce nasceu?". Outros já sao mais abertos e perguntam de cara: "Você é de onde?" Outras pessoas tentam adivinhar:
 " Olha, pelo teu sotaque, eu diria que voce é búlgara. Acertei?"
Eu penso com esse meu cérebro otimizado que Deus me deu: "PQP, búlgara? meu sotaque deve ser bem esquisito mesmo."


Mas aí, dizer que venho do Brasil abre um leque de discussoes e comentários: "você é muito branquinha para ser brasileira." Isso quer dizer, em outras palavras que brasileiros só podem ser negros ou mulatos. Uma pessoa branca nao combina com o estereotipo que os caras possuem da gente. Ou entao:
 - Nossa, entao você vai poder me ajudar, estou querendo aprender a dancar. E você deve dancar maravilhosamente bem. Está no seu sangue.


Eu acho a atividade da danca incrível. Mas dancar, nem em discoteca, com música eletrônica. Se um dia você me ver dancando, pode estar certa de uma coisa: ou eu estou para lá de Bagdá (acontece depois de tomar uns tres ou quatro copinhos de Jagermeister) ou tendo um ataque epilético na pista. Ataque epilético é fácil de dizer por que se parece bem com que eu estou fazendo, quando estou dancando.


Alguns perguntam do futebol e dos jogadores da selecao. Sinto muito mas nao posso falar muito a respeito. Meu conhecimento na área é limitadissimo. 
Aí alguém que está perto escuta a nossa conversa e entra no assunto: 
 - Entao, eu tenho um cunhado que esteve no Brasil, de férias. Ele disse que o Cristo Redentor do Rio de Janeiro e a Baia de Guanabara é incrível. E disse que o carnaval lá é algo inesquecivel. 
Dá pra ver a cara dessa pessoa, esperando um comentario decisivo meu, para que ela comece a juntar dinheiro e organizar umas férias no Brasil. Bom, nesse instante o que eu tenho a fazer é balancar a cabeca tipo "é mesmo?". É  sou do sul e morei em Sao Paulo. Mais que isso do Brasil, eu nao conheco. Nunca fui ao Rio de Janeiro, infelizmente. E nunca participei do carnaval. Acho carnaval uma festa sem graca e de mau gosto. Minha opiniao. 
Aí, ao falar isso, vejo os olhares confusos dos meus interlocutores: uma brasileira que nao gosta de carnaval? Unfassbar! (inacreditável)
Depois de várias tentativas frustradas de puxar conversa sobre o que eles acreditam ser o Brasil e a realidade, a gente se despede ou vai falar de outras coisas: da crise economica, do preco do combustivel, da renuncia do atual presidente alemao.


Ou seja, em outras palavras, nao me encaixo na concepcao de latinamericana, brasileira, vinda-de-um-país-tropical-abencoado-por-Deus-e-bonito-por-natureza que os germânicos possuem. Isso nao me deixa triste, apenas me faz ver como algumas pessoas sao pouco informadas. Pra ser sincera eu entendo bem eles. Sou uma pessoa atípica. Eu diria que sou uma brasileira sem ser. Na cabeca deles, seria mais coerente que eu viesse do país que eles imaginam ao ouvir o meu sotaque. É, deve ser. Acho que de alguma maneira sou uma búlgara mesmo.

Essa é a visao de mundo dos alemaes do continente europeu: a Europa para eles, é isso.
(Imagem que achei no Facebook. Nao pus a fonte por que nao sei de onde vem. Mas achei a ilustracao bem oportuna.)


sábado, 18 de fevereiro de 2012

Bom dia, para quem nao comemora o Carnaval e acha tudo isso uma palhacada! 


Esse fim de semana vou receber visita, por isso vai ficar meio complicado postar o meu novo texto. Mas to na ativa, escrevendo muito e com a cabeca cheia de novas ideias para novos textos. Logo que eu tiver um tempinho, volto pra contar-lhes mais. 


 Um bom fim de semana sem carnaval!

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Tümmerfrauen - elas ainda existem!!

Foto da entrada do Museu de História,
em Peneemünde 




Tempos atuais estao dificeis. Mas eles sao apenas reflexo dos fatos passados. Os germânicos já passaram por tudo o que tinha que passar: guerras, protestos, reconstrucao. Eles ja estao calejados. Por forca da situacao, tiveram que se tornar experts no assunto. E sao craques mesmo: transformar um país totalmente destruido de duas guerras em uma potência mundial nao é para os fracos. Todo o meu respeito para eles nesse aspecto.


Para ficar claro a diferenca cultural e de mentalidade entre os europeus da Europa Central e os latinos:


Paraguai passou por uma guerra terrivel no periodo de 1864 a 1870. Foi o maior conflito armado já visto na América do Sul naquela época. Nesse caso, foi um pouco diferente, já que o Paraguai foi "dominado" pela Tríplice Alianca, formada pelo Brasil, Argentina e Uruguai. E fomos pra cima dos pobres coitados.
Acredita-se que nessa guerra o Paraguai perdeu mais de 300 mil soldados e civis. Sua populacao ficou reduzida naquela época a mulheres, algumas criancas e muitos idosos. E por causa dessa guerra, o Paraguai - que era um dos países mais avancados da época - se tornou o mais atrasado da América Latina. Nunca mais se recompôs.




Museu em Peenemünde
Agora dê uma olhada na Alemanha: Participou ativamente das guerras mais sangrentas, violentas e injustas de que se ouviram falar. Ficou totalmente destruida em 1945. Os filhos da nacao que estavam espalhados pelo mundo, foram torturados e mortos de maneira brutal em campos de concentracao (dos Aliados). A sua populacao ficou ao fim de tudo isso reduzido a mulheres, criancas e idosos.  Como o Paraguai, para se ter uma idéia. 
A única diferenca entre os dois países, é que a Alemanha comecou a guerra e tentou dominar o mundo. E perdeu feio. O Paraguai só reagiu para tentar se defender. 


O que aconteceu depois da guerra é pouco interessante para os livros de historia. E para mim é aí que a coisa comeca a ficar interessante. Eu sempre me perguntei como os sobreviventes da guerra, no país destrocado, comecaram a reconstruir tudo. E o que deu errado que um país como o Paraguai nao conseguiu se reerguer e a Alemanha sim. 





Mulheres do entulhos reconstuindo um edificio.
Fonte: Bundesarchiv Bild 183-H29659, Berlin, Jägerstraße, Trümmerfrauen
Vi uma vez um documentário sobre as mulheres sobreviventes da guerra (em alemao, Trümmerfrauen - mulheres dos entulhos, traducao literal). Foi mais ou menos assim: elas olharam para um lado, olharam para o outro. Entulhos. Entao, se juntaram, comecaram a tirar os entulhos, limpar organizar. Aí viram que precisava reconstruir. E comecaram, perante condicoes climáticas terriveis (inverno, frio, neve), a reconstruir casas que foram destruidas. Mulheres que eram frageis, que nem sequer a guerra podiam ir. Mulheres com filhos pequenos que nunca tiveram a ajuda de maridos já que estes morreram em combate.
Foram elas que salvaram o país. Esse é um fato que nao aparece nos livros de história e explica muita coisa.


 Talvez nao seja uma mera coincidencia o fato da chanceller do país ser do sexo feminino.  
Nesses tempos de crise, a Alemanha é o único país que está se saindo bem e nao foi afetado tao forte como os nossos países vizinhos. Alemanha nao se deixou abalar pelas especulacoes do mercado internacional e continuou trabalhando duro como sempre. Algumas medidas foram tomadas para aumentar o poder de bens de consumo da classe média, já que em tempos de crise as exportacoes de bens de consumo tendem a diminuir. E entao, voilà. Os alemaes nao sairam totalmente ilesos, mas se recuperaram numa rapidez impressionante. A Grécia nao aguentou, a Irlanda tá mal das pernas assim como Portugal. Na Espanha, por exemplo, a coisa tá tao feia que mais de 40% dos jovens saidos da Universidade estao desempregados. Os que têm emprego, só possuem esse privilégio por que se submeteram a trabalhos menos qualificados: Vi muitos espanhois na faixa dos 30 anos, com mestrado no exterior, trabalhando de garcom ou vendedor em lojas de roupas. 


 A Franca, que nao é boba nem nada, deu um jeitinho de aumentar sua credibilidade internacional às custas da Alemanha. A coalisao "Merkozy" está sempre aparecendo na imprensa de bracinhos dados, para alegria do Sarkozy, o primeiro ministro francês. Um homem se rende a uma mulher na luta dos sexos.
Acho que aí está a parte que nos toca: seguir o exemplo. O Brasil já elegeu uma mulher, isso é bom. Mas estamos bem longe de deixarmos de ser uma nacao acomodada e extremamente machista. E para piorar, ainda levamos tudo muito pouco a sério. Nao vamos a rua, nao nos mexemos, nao participamos da vida política do nosso país. Nunca nos mobilizamos. O calor nao deixa, o transito é demais, o dinheiro é pouco, Ah!! o carnavaaaaaaaaaaaaal chegou, esquece. O país tem que parar. 


Muitas desculpas. Muita falta de compromisso. E pouca, pouquissima acao.


Eu fico aqui, cheia de esperancas de que o Paraguai se estabilize como país e corra atras do tempo perdido.  Afinal, nunca é tarde para se recomecar. Nunca.